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24 de junho

decidi escrever poesia assim como uma criança solta um balão. acendi a tocha poética, fui a um céu aberto e lá escrevi um verso.

soltei(me).

nem era preciso ser noite de são joão. meu lápis é deus. a noite será da forma que a criança imaginar. na verdade, está frio e chuvoso, mas desenho outra noite e coloco mais estrelas do que vejo nesse céu poluído da cidade grande. pinto ainda meu balão da cor do canto de um pássaro se preciso for. rabisco se quiser um balão maior que a página. não há limites no céu da palavra, assim como não há trajeto certo para o balão que caminha entre as nuvens. não há volta pra casa ou nova morada quando não há destino. não existe chegada quando o importante é só partir. superei os engenheiros da torre de babel. mais alto, beijei os lábios da lua e pude ainda saber se o gosto de uma nuvem é igual a de um algodão doce. não era. mas eu quis que fosse. e foi. mas poesia não é somente voo, também é queda. não há apenas céu aberto, há também dilúvio. se em babel diversos idiomas causaram confusão, meu caos foi viver só de metáforas. meu erro foi compor metas pesadas demais ao balão. de que vale agora o poeta ganhar a página inteira e perder a sua alma? de que vale o balão preencher o céu e esvaziar-se dentro de si? eu, como pássaro, quis viver de voos e despropósitos, quis voar acima dos signos de ar, mas perdi de vista o ninho. quis pousar, mas construí aeroportos nas nuvens. o balão se perdeu no céu. resta-me torcer para que ele não caia na gaveta. poesia não cai num móvel velho, nem na lista do vestibular, isso é só literatura. poesia é diferente; quando cai, o fogo chega e a chama alastra corações. o balão se perdeu na imensidão da página, nem pertence mais ao menino. o verso também não pertence mais ao poeta, que se perdeu na imensidão da vida. o menino vai ser poeta quando crescer, mas não vai saber fazer poesia. na infância, vai soltar balões e bombinhas nas noites de são joão, para depois de alguns anos soltar versos num sarau. a não ser que ele consiga ser o próprio balão e não se incomode de ser voo e queda no mesmo céu-página. Poesia é arriscar-se num voo para dentro do labirinto de si.



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